Instrumentos para falar de Freinet hoje.
ð Especificamente é o olhar do historiador sobre as práticas que formaram a pedagogia de Freinet.
ð As técnicas pedagógicas deverão ser aprofundadas com as indicações de leitura apresentadas no final da palestra.
ð Vamos falar de Freinet numa perspectiva histórica. A construção do pensamento sobre a escola, a sala de aula e as condições para o aprendizado a partir do perfil sócio político de Freinet, seu tempo histórico, seu espaço geográfico como fator essencial e imprescindível para compreender o pensamento do autor.
ð A análise científica para tal, será feita a partir de um outro autor. Michel de Certeau através do seu texto; A Invenção do Cotidiano. Certeau é Filósofo, pensador das Letras Clássicas, Historiador e Teólogo. Como Freinet, nasceu na França.
Estrutura da palestra; (Projeto Cefam 2000)
4 Introdução. 4 O pensamento de Michel de Certeau. 4 Freinet, uma breve biografia. 4 A construção da pedagogia Freinet.
4 As bases da pedagogia de Freinet. 4 A produção bibliográfica de Freinet. 4 A experiência da pedagogia de Freinet na Escola Curumim, Campinas.
Antes de falarmos de Freinet, vamos fazer uma fundamentação teórica sobre os instrumentos de análise e sobre as ações e os pensamentos através de um autor chamado Michel de Certeau. Seu texto, A Invenção do Cotidiano (1. Arte de fazer), editado pela Editora Vozes, atualmente na 4ª edição trata de;
“O ato diário de retomar o que já está relatado. Observar questões ligadas a escrita da História e a escrita que faz/fez História. A forma de se registrá-la. Os relatos transformam os espaços, os lugares por meio de seus agentes. As pessoas atuam dentro das inovações propostas a partir de seu entendimento e atendimento de suas expectativas.”
Sobre o pensamento de Certeau;
N (...) “A meta seria alcançada se as práticas ou “maneiras de fazer” cotidianas cessassem de aparecer como fundo noturno da atividade social, e se um conjunto de questões teóricas e métodos, de categorias e de pontos de vista, perpassando esta noite, permitissem articulá-la.” (página 37, sobre a pesquisa do cotidiano)
N (...) “A “trajetória” evoca um movimento, mas resulta ainda de uma projeção sobre um plano, de uma redução. Trata-se de uma transcrição. (...) Chamo de “estratégia” o cálculo das relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder é isolável de um “ambiente”. (...) A nacionalidade política, econômica ou científica foi construída segundo esse modelo estratégico.” (...) (página 46 sobre como pesquisar as práticas cotidianas)
N (...) “Falando de modo mais geral, uma maneira de utilizar sistemas impostos constitui a resistência à lei histórica de um estado de fato e suas legitimações dogmáticas. Uma prática da ordem constituída pôr outros redistribui-lhes o espaço. Ali ao menos ela cria uma jogo, por manobras entre forças desiguais e por referências utópicas. “ (...) (página 79, sobre o “jogo” na construção e uso da sabedoria popular)
N (...) “A progressiva compartimentalização dos tempos e dos lugares, lógica disjuntiva da especialização pelo e para o trabalho, não encontra contrapartida suficiente nos rituais conjuntivos das comunicações de massa.”(...) (página 89 sobre a dissimulação do que se chama “sucatas” diárias)
N “As práticas cotidianas estão na dependência de um grande conjunto, difícil de delimitar e que, a título provisório, pode ser designado como o dos procedimentos. São esquemas de operações e manipulações técnicas.”(...) (página 109 sobre as várias Teorias da arte de fazer)
N (...) “Todo relato é um relato de viagem – uma prática do espaço. A este título, tem a ver com as táticas cotidianas, faz parte delas, desde o abecedário da indicação espacial (“dobre à direita”, “siga à esquerda”), esboço de um relato cuja conseqüência é a escrita pelos passos, até ao “noticiário” de cada dia (...) Essas aventuras narradas, que ao mesmo tempo produzem geografias de ações e derivam para os lugares comuns de uma ordem, não constituem somente um “suplemento” (...) De fato organizam as caminhadas. Fazem a viagem, antes ou enquanto os pés a executam.”(...) (página 200 sobre os relatos do espaço)
N (...) “A escrita, possibilidade de compor um espaço conforme a um querer, se articulava com o corpo como em cima de uma página móvel, opaca, fugidía. Dessa articulação o livro se tornava a experiência em laboratório, no campo de um espaço econômico, demográfico ou pedagógico. O livro, é no sentido científico do termo uma “ficção” do corpo escrevível: é um cenário construído pela perspectiva que visa fazer do corpo aquilo que uma sociedade pode escrever.”(...) (página 300 sobre a escrita como memóriapósmorte)
BREVES BIOGRAFIAS DE FREINET
O cidadão, o militante, o homem francês Freinet.
15 de outubro de 1896 – nasce no sul da França, vilarejo chamado Gars
Passa a infância como pastor de rebanhos, Provença
1912 – Entra na Escola Normal de Nice
1914 – Interrompe seus estudos para lutar na Primeira Guerra Mundial (1914 a 1918)
(* ferido gravemente nos pulmões, efeito de gases tóxicos)
1920 – Na pequena aldeia de Bar-sur-Loup, inicia seu trabalho, numa escola instalada em uma casa velha, pobre e escura, carteiras quebradas e colocadas de forma tradicional.
1923/24 – Participa do Congresso da Liga Internacional para Educação Nova. Reunião dos grandes educadores da época, que discutiam novas formas para atribuir à criança um papel ativo na educação.
1925 – Vai à URSS, convidado pelo Sindicato Pan-Russo dos Trabalhadores de Ensino. Freinet viaja com o objetivo de colher informações para preparar, em regime capitalista, o advento da escola do povo. A viagem contribui para sua posterior adesão e militância no Partido Comunista.
1926 – Casa-se com Élise Lagir Bruno (artista ligada às artes plásticas que teve influência fundamental na elaboração da idéia de livre expressão na pedagogia Freinet).
1928 – Pede transferência para Saint-Paul de Vence. Pequena e típica vila medieval. Como em Bar-sur-Loup, a escola estava em péssimas condições.
1933 – Considerado “revolucionário” pela burguesia local de Saint-Paul, Freinet será exonerado do cargo de professor por ordem da prefeitura local. Acusação; espionagem russa (devido ao grande movimento do correio). Europa vive o clima de guerra com o crescimento do nazi-facismo.
1934 – Freinet demite-se do ensino público. Recusa o convite para retornar a Bar-sur-Loup.
1935 – 1º de outubro inaugura a Escola Freinet, uma escola livre, a primeira escola proletária particular da França.
1937/38 – Escola Freinet torna-se centro de acolhida de crianças exiladas espanholas vítimas da guerra civil.
1940 – O PC francês é proibido e Freinet considerado um líder terrorista perseguido e preso. 1939 eclode a Segunda Guerra Mundial, Freinet ficaria preso até 29 de outubro de 1941.
1945 – Retornando a sua visita à URSS, vale lembrar que Freinet sem um conhecimento profundo, aprovou as prática educativas russas. Mais tarde viria a condená-las, sabendo-as fruto de uma pedagogia mais dogmática e repressora que a francesa. Neste ano começa a ter problemas com as lideranças do PC francês.
1950 – É acusado de apresentar uma proposta pedagógica a serviço da burguesia. Deixa o PC e defende-se das acusações, mostrando que o trabalho na escola deve ser visto não só como um meio didático mas como uma prática ligada à vida e ao contexto histórico e social dos alunos.
1966 – 8 de outubro, faleceu deixando seu trabalho conhecido em mais de 20 países. Morreu em sua escola, em Vence, em meio aos pinheiros, com seus caminhos ladeados de pedras. Sua mulher Elise e sua filha Madeleine continuariam escrevendo e divulgando o trabalho da pedagogia freinetiana.
Cronologia para a construção de um pensamento pedagógico
1920 – Na pequena aldeia de Bar-sur-Loup começa seu trabalho como educador em uma escola bem pobre. Sem muita experiência pedagógica começa a elaborar algumas práticas diante das dificuldades. Atento ao interesse das crianças pelo mundo externo à escola cria a Aula Passeio.
1920 – Começa a escrever artigos para a revista L’école mancipée órgão da Federação de Ensino.
1922 – Nas férias escolares começa a visitar escolas de tendência Anarquista na Alemanha.
1923 – Freinet começa a trabalhar com o texto livre e a impressora na escola. Vários professores franceses de outras regiões começam a escrever para Freinet afim de conhecer tais práticas.
1924 – O texto livre e a impressora, criam espaços na prática diária da sala de aula, para o Livro da Vida e a Livre Expressão. Os alunos de Freinet tinham liberdade para escrever suas idéias, discuti-las em sala e depois imprimir o próprio texto.
1924 – Contatos com outros professores faz surgir a Correspondência Escolar. Os textos produzidos em sala não seriam lidos só pelos pais e a comunidade. Freinet ampliará o círculo de leitores. É a prática da chamada Imprensa Interescolar.
1925 – Freinet traz para a sala de aula uma câmara e um projetor. A idéia é trazer o cinema e suas linguagens para seus alunos.
1926 – Com a chegada/casamento com Élise, Freinet vai reelaborando o espaço da sala de aula. As influências artísticas da esposa, impulsionam a chamada Livre Expressão. Vai organizando os Cantos de Atividades para cada tipo de atividade.
1927 – Freinet com a colaboração de um amigo, edita neste ano o Primeiro Livro, “A imprensa na escola”. Freinet recebe pedidos de informações de professores de toda a França.
1927 – É criada a primeira revista da Cooperativa de Ensino Leigo/CEL. Reunião de todos os professores que comunicavam-se com Freinet.
1927 – Primeiro Congresso da Imprensa na Escola. Em Tours, mais de 50 escolas, inclusive algumas estrangeiras vão discutir as técnicas do material imprenso na escola. Afirma-se e comprova-se o nascimento de uma nova pedagogia; “Pedagogia Freinet”.
1928 – Tendo em vista vários problemas em sala, na nova escola em Saint-Paul de Vence, Freinet repensa as formas de decisão em sala. Da mesma forma que se discutiam os textos, agora também os alunos vão discutir seus problemas não só das dificuldades com as matérias mas de organização interna. Surgem as Rodas de Conversa.
1935 – No Congresso Internacional do Ensino, realizado em Meudon, Freinet apresenta suas idéias sobre a Frente da Infância. Da proteção e incentivo a infância.
1964 – É fundada a Federação Internacional do Movimento da Escola Moderna – FIMEM. Afirma-se assim o caráter internacional do movimento Freinet, agrupando professores de mais de 38 países
1968 – Com a militância de Elise e Madeleine, em Paris é divulgada a “Carta da Escola Moderna”
Pensadores que influenciaram Freinet.
ROUSSEAU: Jean Jacques Rousseau, filósofo social e político franco-suiço, viveu de 1712 a 1778. O núcleo de seu pensamento foi a questão da possibilidade e forma ideal de conciliar o indivíduo, com sua psicologia complexa e sua singularidade, com as exigências da sociedade.. Principais obras;
1. “Do Contrato Social”/1762
2. “Emílio”/1762; romance pedagógico e filosófico que consta a história da educação de um personagem central, desde o seu nascimento até os 20 anos de idade. Obra expõe as ideías do autor sobre a valorização da natureza, da criatividade, da sensibilidade enfim do processo educacional. Obra teve papel revolucionário na história da educação.
RABELAIS: François Rabelais, médico, monge francês viveu de 1494 a 1533. Autor de Garganta e Pantagruel, obra máxima da literatura universal e expressão viva do pensamento Renascentista. Realizou diversas viagens pelo interior da França, cujos hábitos e costumes viriam a influenciar suas obras. MONTAIGNE: Michel de Montaigne, ensaísta francês, viveu de 1533 a 1592. Criador do “ensaio moderno” (estudo literário menor que um tratado sobre um determinado assunto). Sua principal obra é “Ensaios”de 1595. Trata de simples comentários sobre citações de seus autores preferidos. O estilo direto e brilhantes fez obra evoluir para uma das obras mais importantes para os pensadores Iluministas do século 17. PESTALOZZI: Johann Heinrich, foi um educador suíço que viveu entre 1746 e 1827, considerado uma das mais importantes figuras da história da pedagogia. Adepto de Russeau defendeu um ensino baseado na experiência. Concentrou suas atenções no ensino elementar e dedicou-se a ensinar crianças pobres. Humanista profundo, exerceu grande influência no mundo inteiro no que se refere aos métodos para treinamento de professores. Sua principal obra é “Como Gertrudes Ensina seus Filhos” de 1801. COMENIUS: Jan Amos Comenius, teólogo humanista reformador educacional tcheco. Defendia a educação universal e o ensino do latin como linguagem comum. Escreveu suas obras em vários idiomas, sendo ela; Didactica Magna (A Grande Didática)1632. · Educadores escolanovistas. Ferrière, Claprède, Decroly, Bovet e Cousinet; Contemporâneos de Freinet. Todos tem em comum o pensamento de que a criança e suas idéias tem papel ativo em suas vidas. O homem é um ser social e fazedor de história, procura dar um sentido mais profundo à palavra atividade que o proposto pela Educação Nova.
A Pedagogia Freinet
A BASE DA PEDAGOGIA EM TRÊS GRANDES IDEÍAS DE FREINET
1. EDUCAÇÃO PARA O TRABALHO: Só o trabalho é realmente formador. Primeiro porque propõe as motivações mais fortes para a aprendizagem. Segundo porque as aquisições do trabalho é que serão mais úteis na vida social e profissional.
2. DESENVOLVIMENTO DAS POSSIBILIDADES/HABILIDADES DE CADA CRIANÇA: A descoberta da identidade pessoal, sem a qual nenhum indivíduo pode alcançar seu pleno desenvolvimento exige necessariamente a valorização de suas qualidades pessoais. Daí a diversidade de atividades propostas em sala de aula. Cada criança deve dispor de atividades que lhe permitirão conhecer-se, afirmar-se e, assim adquirir existência própria.
3. TRABALHO COOPERATIVO: É necessário fazer com que cada criança sinta que não está só, mas que pertence a um coletividade. É mediante a inserção bem sucedida no meio social que um ser humano encontra e experimenta melhor sua identidade.
ALGUNS PRINCÍPIOS DE FREINET
· Conforme no que Freinet chamou de Invariantes Pedagógicas. São 30, abaixo selecionamos algumas que são fundamentais para conhecer o pensamento de Freinet:
a) A criança e o adulto tem a mesma natureza.
b) Ser maior não significa necessariamente estar acima dos outros.
c) A criança e o adulto não gostam de imposições autoritárias.
d) Ninguém gosta de trabalhar por coerção. A coerção é paralisante.
e) É preciso abolir a escolástica, porque ela não prepara para a vida.
f) Todos gostam de escolher seu próprio trabalho, mesmo que essa escolha não seja a mais vantajosa.
g) Ninguém gosta de trabalhar sem objetivo, atuar como máquina, sujeitando-se a rotinas nas quais não participa.
h) Todos querem ser bem-sucedidos. O fracasso inibe, destrói o ânimo e o entusiasmo.
i) Não são a observação, a explicação e a demonstração – processos essenciais na escola – as únicas vias normais de aquisição de conhecimento, mas a experiência tateante, que é uma conduta natural e universal.
j) As notas e classificações constituem sempre um erro.
k) Fale o menos possível. Quanto menos falar mais coisas você fará.
l) A ordem e a disciplina são necessárias na aula.
m) A democracia de amanhã prepara-se pela democracia na escola. Um regime autoritário na escola não seria capaz de formar cidadãos democratas.
n) A reação social e políticas, que manifesta uma reação pedagógica, é um oposição com a qual temos que contar, sem que possa evitá-la ou modificá-la.
Práticas em uma sala de aula Freinet
1. Livro da Vida.
2. Jornal de Parede.
3. Texto Coletivo.
4. Trabalho cooperativo (ou trabalho em grupo).
5. Rodas de conversa.
6. Aulas passeio.
7. Material de consulta, textos e outros recursos produzidos pela própria turma.
8. Imprensa escolar.
9. Jornal mural.
10. Correspondência Interescolar.
Para saber mais sobre Freinet
Leia:
Freinet Evolução Histórica e Atualidades Rosa Maria Whitaker Ferreira Sampaio, Editora Scipione Série Pensamento e Ação no Magistério
Célestin Freinet Uma Pedagogia de Atividade e Cooperação Marisa Del Cioppo Elias Coleção Educação e Conhecimento Editora Vozes
Pedagogia Freinet Teoria e Prática Marisa Del Cioppo Elias (organizadora) Autores Diversos Editora Papirus
O Itinerário de Célestin Freinet A livre expressão na pedagogia Freinet Élise Freinet Livraria Francisco Alves Editora S.A.
OBRAS ESSENCIAIS DE FREINET
A Pedagogia do Bom Senso Editora Martins Fontes C. Freinet
A Educação do Trabalho Celestin Freine t Editora Martins Fontes
O Método Natural II A aprendizagem do desenho Celestin Freinet Editorial estampa
Para uma escola do povo Celestin Freinet Lisboa Editorial
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