sexta-feira, 12 de julho de 2013

Entrevista. Democracia na escola.

entrevista para aluna do 3º ano do Projeto Cefam em 2000

Tema; Democracia na escola.
1ª A minha concepção de democracia segue o sentido grego da coisa. Na organização da Pólis (cidade) combina-se meios de decisão definindo que a vontade da maioria, será o pensamento majoritário nos destinos locais. A democracia seria então um meio social onde a vontade das pessoas seriam no mínimo ouvidas e votadas. Democracia só existe se houver princípios participativos a princípio individuais. Essa vontade é coletivizada a medida em que as necessidades também o são. Mesmo assim essa concepção é meio problemática pois em Atenas os estrangeiros e escravos não eram considerados cidadãos. Atualmente, já que a Grécia de que estou falando tem mais de 2 mil anos, tais princípios não mudaram. O problema tem sido a dimensão evolutiva atingida pela humanidade. Como ouvir todos e colocar tudo em votação numa cidade como São Paulo com mais de 10 milhões de habitantes ? Inventaram um processo “democrático” chamado eleições político partidárias, mas aí é outra história.  
2ª Sim. O espaço é coletivo. Se falta luz numa sala, o problema não é só daquela turma que ali freqüenta e sim dos professores que dão aula lá e dos funcionários. Outras realidades maiores que dizem respeito da sala de aula, também são do interesse da comunidade escolar. A democracia pode ajudar na identificação de tais problemas e no encaminhamento de suas soluções. O contrário, é entregar nas mãos de algum "guru" iluminado o pensamento do que fazer e como fazer tudo para todos.
3ª A função social da escola é transmitir via ensino o conhecimento acumulado na história da humanidade a todos que nela vão buscar sua formação. Ao longo da História a humanidade acumulou experiências democráticas ou não. A escola agora deve mostrar os dois exemplos alertando sobre o custo e benefício de cada uma. Deixando assim livres os pensamentos para que escolham os melhores caminhos para o futuro. Em se tratando de ensino fundamental, professores e educadores em geral devem priorizar o processo democrático não só na teoria, mas na prática também já que, nos é meio unânime que as experiências históricas fora do processo democrático se mostraram os maiores desastres.
4ª Trabalho em duas escolas. Ambas no Brasil, um país que ficou recentemente vinte anos numa das piores ditaduras latino americanas da História. Num país de só 500 anos, uma ditadura tão recente deixou seqüelas profundas. Acredito que por mais eleições que possamos participar ou mesmo colocar algumas decisões no coletivo, a democracia , na raiz da concepção da palavra ainda está muito longe de ocorrer. A democracia direta vivenciada pelos gregos em Atenas do Mundo Antigo é passado. Hoje as escolas são organizadas em instâncias burocráticas decisórias trazendo muitas coisas prontas. Alguém decide por mim quanto devo ganhar e o que devo ensinar. Alguém determina a quantidade de horas do meu trabalho. A escola hoje é um apêndice da sociedade liberal burguesa capitalista que em essência não é democrática. O capitalismo é anti democrático e excludente, nossas escolas que tem entre outras funções preparar futuros profissionais, poderia ser democrática ?
a)     Na escola liberal burguesa (as nossas no Brasil) as instâncias citadas desempenham papel figurativo no processo. São importantes não nego, mas devem encaminhar suas decisões sobre políticas já determinadas por instâncias superiores. Nenhuma dela interfere nas políticas nacionais para a educação. O secretario, o ministro e qualquer burocrata de plantão decide algo que vai ter implicâncias sérias na vida da comunidade escolar. O que a APM, Conselho de Escola, Grêmio fazem é adequar a realidade da escola dentro destas políticas. Podem ser mais ou menos ousados dependendo do seu projeto político de envolvimento da comunidade escolar, ouvindo as opiniões de todos e conquistando espaços dentro da escola, interferindo no que pode ajudar na qualidade do ensino. Trabalho em uma escola onde o regime é cooperativado, mesmo assim o grupo que dele compõe restringe decisões importantes nas mãos de um grupo de acionistas.
b)     Não trata-se de repressão. É como organizou-se a sociedade no mundo Moderno. Qualquer educador sério sabe da importância do processo democrático na escola. O que está em questão aqui é o que é possível ou não realizar dentro das estruturas já explicadas.
6ª  Concordo. Esse papo que a escola hoje é democrática porque procura oferecer espaços para incluir todo mundo, é pura balela ! A escola como parte da estrutura social, atende o sistema vigente, ou seja o capitalismo. Hoje estaria conforme as necessidades de mercado. O Plano Decenal de Educação definido na Tailândia em 1994 reunindo as 10 nações com os maiores índices de analfabetismo é a prova cabal disso. Brasil, Malásia, China entre outros foram obrigados a assumirem compromissos sérios com o capital internacional de diminuir os índices de analfabetismo afim de definitivamente terem uma inserção no processo de globalização vigente. Só que no Brasil, na medida em que os professores ganhem essa miséria de salário, são obrigados a uma dupla ou tripla jornada de trabalho e às péssimas condições de trabalho acabam por colaborar com a massificação do ensino pois são levados a aderirem pela falta de aperfeiçoamento profissional a seguir as cartilhas do estado para a educação.
a)     É uma dicotomia ! Houve democracia no processo de definição das políticas nacionais pois os políticos que a fizeram foram eleitos pelo voto direto num processo que em tese é legítimo. No entanto os alunos, professores, pais e especialistas não foram ouvidos. Prevaleceu as vontades do mercado e da adequação das políticas às necessidades da mundialização social. Como já disse acima a escola em si, não participa das decisões das políticas públicas para o ensino. A democracia é uma bela teoria que garante a dissimulação social.
b)     Nos afeta no sentido de manter o “status quo” social. Não se visualiza nada em termos de futuro. Quando muito algo terrível como um processo de privatização do ensino. Cria-se uma certa ilusão de que algumas atitudes pretensamente democráticas são garantias de que ali se ouve todo mundo antes de decidir. A escola como centro de excelência do conhecimento deveria interferir de forma contundente na escolha dos sistemas sociais vigentes ou não. Nossas escolas hoje como estão, estão dizendo SIM ao Neoliberalismo, globalização, FHC, ACM, Blocos Econômicos e outras causas de toda essa miséria presente no país. Você pode estar pensando que estou defendendo uma escola para um regime Socialista, Não disse isto e não estou fazendo esta defesa. O modelo social político e econômico ideal será aquele definido num processo real, democrático e sensível às necessidades do povo.
9ª Os professores ainda detém o monopólio da nota. Deveriam descentralizar isso proporcionando ao aluno espaços de definição de quais notas deveriam tirar nas atividades propostas. Tenho tentado fazer isso nos 2º s e 3º s anos mas esse processo originalmente democrático deve obedecer uma transição. Nela tenho ouvido tamanhas aberrações do tipo; gente que é semi alfabetizada, está no 3º ano e quer por que quer ficar com A ou B, porque essa é “a opinião dela”! Porra! Isso não é democracia ! É oferecer espaço de manifestação para gente que confunde as coisas. No entanto tenho tentado como professor dividir responsabilidades ao que diz respeito a vida de meus alunos. Da mesma forma sobre os espaços do calendário coletivo e das avaliações do trabalho desenvolvido pelo professor. Neste item apesar do festival de bobagens que se ouve, a prática democrática está prevalecendo pois acata-se muita coisa proposta com solidez pôr alunos mais lúcidos sobre o processo em sala de aula. Ainda há muita confusão ao meu ver. O aluno acha que pôr ser uma necessidade a democracia dá para mandar o professor “ir `a merda”, quando dele descorda. Além de ser uma tremenda falta de educação suscita a idéia de que a democracia pode ser uma arma contra o inimigo. Como educador das práticas Freinét de ensino, ouvir o grupo (sala), combinar coisas com ele e resolver os problemas com ele definem meu perfil profissional em sala de aula. Voltando à história da nota, muitos alunos acham que o professor é anti democrático pois detém o conhecimento e repassa-o conforme quer. Dá notas e faz muitas cobranças. Aqui outra confusão. Pois o papel do professor qual seria se não desempenhasse tais funções ? Muita gente diz que o professor deveria ser mais amigo dando um jeitinho aqui e ali. Se optar em ser amigo, quem será o professor ? Tratar bem as pessoas, ouvir a todos, saber conversar e outros princípios do que chamam amizade, fazem parte do perfil do bom profissional. Ser exigente com outras coisas também.
10ª Democracia mais que um belo discurso, deve ser uma prática freqüente e diário na vida das escola. Não adiantam rituais pseudo democráticos tentarem dar uma mostra de que há democracia apenas colocando em votação alguma coisa. Na Grécia Antiga todos que não participavam dos processos decisórios da Pólis eram chamados de idiotas. Alienados e individualistas acabam por interferir nos processos educacionais pois são os que dizem amém a todas essas políticas absurdas do ensino. Mais gente deveria incomodar-se com as atuais decisões dos governantes para o ensino. A escola hoje tem definido nosso futuro. As pessoas não tem percebido isso, a escola de hoje está moldando os próximos 30 anos do país......

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